7.3.19

"A METADE DO CÉU" | MUSEU ARPAD SZÉNES VIEIRA DA SILVA | PROJETO DE PEDRO CABRITA REIS

Em 2019, o Museu Arpad Szenes – Vieira da Silva celebra o vigésimo quinto aniversário de abertura ao público. É no âmbito desta celebração que, a par das obras de Maria Helena Vieira da Silva, o museu apresenta, entre 21 de Março e 23 de Junho, um projecto expositivo com a assinatura de Pedro Cabrita Reis: A Metade do Céu. O artista propõe uma exposição colectiva inteira e declaradamente liberta de qualquer condicionalismo temático, desprovida de uma narrativa curatorial e que se quer, aliás, alheia ao artifício discursivo. Ora, antes assente numa intenção elementar, nessa vontade axiomática, já inabalável: «[...] que fosse, muito simplesmente, um modo de revelar o pensamento, o olhar e a prática criativa d’A metade do ceú [...]» – aquela que, segundo Mao Tsé-Tung, toda e qualquer mulher sustenta. É a partir desta expressão, achada num texto atribuído ao líder chinês, que o artista concebe e desdobra o projecto expositivo, lembrando, ainda assim, «[...] que a arte foi e será sempre avessa e imune à ideologia...». Importa, sobretudo, esse intento exordial. Importa trazer ao encontro de Vieira da Silva uma perspectiva singular – pessoal, afectiva, decerto apaixonada – sobre essa outra metade. Pedro Cabrita Reis traz ao Museu Arpad Szenes – Vieira da Silva uma importante selecção «[...] de Josefa de Óbidos até ontem [...]», para celebrar o contraste, o princípio da divergência. A metade do céu instaura um território de confronto – e, desde logo, pelo seu carácter pluridisciplinar, convocando o desenho e a pintura, a escultura e a instalação, a fotografia e o vídeo. Contudo, a demanda pela alteridade está para lá da dimensão formal. Interessa o conflito, tanto ou mais que o consenso. Há que atentar, muito particularmente, no conflito que lateja em cada trajectória, contrariando uma visão padronizante eventualmente alimentada pela (ou por alguma) história da arte. Pois que esta exposição perscruta o lado lunar de cada artista, dando a ver, sempre que possível, o que menos se espera dela – uma ou outra obra não tão frequentemente mostrada, talvez até desfasada, de algum modo inusitada. É o caso de Menez, Ana Hatherly ou Helena Almeida. A metade do céu traduz uma certa ânsia pelo estremecimento do desvio epifânico, dessa queda absolutamente primordial. Por certo, mesmo a mais ilustre e estudada artista é aqui apresentada para e na iminência de ser redescoberta, uma e outra vez, pelo olhar contemporâneo. Há que trazer a natureza morta de Josefa de Óbidos à luz da produção artística actual – mais não seja, em busca desse assombro. É justamente na tangência, algures no interstício, que se cumpre o desígnio da exposição.